quinta-feira, 8 de maio de 2014

Legado

Se eu morrer amanhã, não deixem que me enterrem, pelo amor de Deus.
Mandem me cremar.
Eu sei que parece estranha a ideia de ter o corpo em chamas, mas é justo com quem teve uma vida cheia de "calores do momento".
Me cremem. Depois, joguem minhas cinzas em qualquer lugar em que haja vento forte. Me deixem ser a sutileza e a delicadeza que nunca tive em vida. Me deixem voar pros lugares que eu nunca conheci.
Se eu morrer amanhã, não deixem que minha mãe se desespere. Peçam para o meu pai parar de chorar.
Se eu morrer amanhã e não tiver feito nada que valha a pena perdurar por séculos e séculos, me deixem morrer como alguém que aceitou ser esquecido e espera que, com o esquecimento, venha também o perdão.
Não aquele perdão divino, iluminado e maravilhoso do coração mais leve que a pena. Falo do perdão desses seres mundanos que eu tanto amei e odiei. Das feridas que eu abri, das feridas que eu tentei sanar e de toda gota de sangue ou lágrima que se fez presente.
Se vocês, seres mundanos que poderão então me esquecer, forem capazes de me perdoar, independentemente de quais foram os fatos, está feito o meu legado.
Se eu morrer amanhã, não sintam saudades. A saudade me remete à aquilo que poderia ter sido e não foi. Algo mal resolvido. Mas, se eu morrer amanhã, todo o tempo vivido foi o bastante.

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